PRESS TO OPEN
Estavam ali as portas
janelas e varandas.
Estavam ali
na fronteira do olhar
onde o de dentro encontra
justamente
com o de fora.
Nesse ponto exato
elas estavam.
Bastava um gesto.
Mas o meu estar parado
era maior do que eu.
Estar parado/estar vivo:
a mesma incompreensão e medo
entre mim e aquele estar das coisas.
Estar ali
como nunca ter chegado.
Estar ali
como ter visto absolutamente tudo.
Estar ali
por estar ali.
E além de mim
o que eu não ousava.
Ah:
relembro a amplidão dessas varandas
os pequenos raios de luz
nos vidros coloridos das janelas.
Revejo a dura consistência da porta
cerrando seu segredo.
E me retomo ali
no imóvel do gesto que não fiz.
Como se pudesse agora
escancarar portas e janelas
para sair nu pelas varandas
desvairado e nu
- um profeta, um louco, um santo.
Sair para o vento, o sol, as tempestades,
as neves, as quedas de estrelas e Bastilhas,
o cheiro de jasmins entontecendo os quintais.
(Pudesse retomar manhãs, amigo,
manhãs perdidas como o que não fui.)
Mas continuo ali.
Aqueles espaços
permanecem tão mortos de mim
como um corpo que se ama
e não se toca.
Londres, 4.2.74
Caio Fernando Abreu
Caio 3D - O Essencial Da Década De 70, Editora Agir
Nenhum comentário:
Postar um comentário